Boletins de ocorrências e ação para pedir indenização são resposta aos furtos de peças em túmulos centenários do São Salvador: crimes continuam após queixas
Assim como no túmulo da família Pierucetti, outros nichos estão sem portas e lápides, como revelam imagens feitas por Eduardo Pierucetti (Arquivo Pessoal)
Furtos de lápides, portões e imagens sacras de túmulos de famílias com sobrenomes como Oliver (descendentes do Cabo Diogo Oliver, um dos mogianos que morreram na Segunda Guerra), Pieruccetti, Abe, Alabarce e Borenstein estão sendo denunciados por vítimas que descobriram a onda de violações nos últimos dias. Pressão por segurança e ações conjuntas na Justiça por indenização são planejadas pelo empresário Eduardo Pieruccetti e Kathy Francine Oliver que registraram boletins de ocorrência sobre as crimes nesta sexta-feira (17).
Em um intervalo de dois dias, foram furtadas peças do túmulo da família Pierucetti, onde estão enterradas pessoas conhecidas da cidade, como o jogador de futebol mogiano, Jose Pieruccetti, o Peru, que faleceu em 2013 aos 80 anos. O irmão dele, Hugo e o filho dele, José Carlos Pieruccetti, funcionário da Braskem que faleceu no acidente com o avião da TAM, do voo 3054, ocorrido em 17 de julho de 2007, também foram seultados no nicho familiar. Ele tinha 43 anos quando faleceu.
Eduardo conta que dona Claudete, que zela pela limpeza e cuidados com túmulo, ligou para avisar que na segunda-feira (13) foi levada a portinhola do túmulo. Dois dias depois, na quarta-feira (15), um anjo de bronze, que havia sido instalado no endereço há 60 anos, foi também furtado. Os dois registros foram na mesma semana.
O empresário de 65 anos que reside em São Paulo desde os 13 anos e atua como construtor no mercado de leilões, relata que passou toda a sexta-feira (17) em Mogi das Cruzes tentando entender o descaso com a "memória, a história de quem construiu a cidade nas últimas décadas".
Ele fotografou túmulos de famílias com sobrenomes como Alabarce, Borenstein e Abe (do ex-prefeito Junji Abe), além de outras tiveram peças furtadas. Pretende encaminhar aos conhecidos e organização uma ação conjunta contra as violações e a falta de providências do poder público municipal.
Nas imagens, é possivel ver que as portas de entrada dos túmulos desaparecem em grande parte das estruturas. Locais onde estavam vasos chumbados estão despidos, assim como se nota a ausência das inscrições que registram as datas de nascimento e morte dos mogianos ali enterrados.
Houve uma tentativa de se rastrear as digitais de quem levou o anjo do túmulo familiar, mas, a umidade e a chuva prejudicou a coleta das impressões, o que poderia auxiliar na identificação dos autores.
Eduardo promete reunir outras famílias para ir à justiça contra a Prefeitura: "O meu pai comprou aquele túmulo da Prefeitura e, neste cemitério, não há vigilância, câmeras, nada. O que estava acontecendo ali é o fim da história da cidade", resume.
Um herói mogiano
Um print de uma reportagem publicada no último dia 16 é uma prova que mais revolta Kathy Francine Oliver, uma das vítimas das violações de túmulos no Cemitério São Salvador, em Mogi das Cruzes. Apenas um dia depois da publicação dessa entrevista, na sexta-feira, 17, ela tomou conhecimento sobre a onda de furtos que familiares de mogianos enterrados em um dos mais antigos cemitérios da cidade estão acompanhando desde o final do ano passado. Na quinta-feira (16), confirma a imagem, ainda era possível ver as peças com os nomes de descendentes do revolucionário Cabo Diogo Oliver, que faleceu durante a Revolução Constitucionalista. Na sexta-feira, quando Kathy foi ao local, as lápides não estavam mais ali.
"Ou seja, os furtos já denunciados continuam acontecendo e ninguém, nem a Prefeitura, nem a Guarda Municipal, fazem nada para impedir? Eu estou revoltada com a falta de respeito e ação. Perdi noites de sono, choro", diz ela, que registrou um boletim de ocorrência e pretende se unir, a outras pessoas lesadas, para cobrar providência e indenização. Nesta semana, ela lembra o quarto ano da morte do pai, o que ainda torna essa profanação ainda mais simbólica.
Kathy Francine Oliver "printou" reportagem que mostrava o túmulo da família Oliver ainda com as peças: um dia depois da publicação, acervo foi furtado (Arquivo Pessoal)
O que está ocorrendo no Cemitério São Salvador tem sido noticiado há algumas semanas, inclusive, por O Diário. Mas, Kathy só tomou conhecimento na última sexta-feira, quando foi ao local, e viu que muitos outros túmulos, inclusive de conhecidos dela, também estão violados.
Também nesta semana, o túmulo da família Oliver perdeu lápides e um portão, conforme consta em boletim de ocorrência (Arquivo Pessoal)
"Muitas pessoas, como eu, não sabem que estão roubando as placas e portões", diz, inconformada com respostas que têm sido dadas pela Prefeitura (veja reportagem aqui).
Furtos no São Salvador e em outros cemitérios ocorrem de tempos em tempos. Porém, agora, a multiplicação dos crimes e a demora no combate, revolta Kathy Oliver. "Eu conversei com os funcionários que me disseram que informam a Prefeitura, pedem cercas elétricas. Noto que um fica empurrando para o outro e, se não é responsabilidade da Prefeitura, de quem é? Nós pagamos os impostos para isso", relata.
A última vez que a moradora esteve no cemitério foi no dia de Finados. Hoje (18), ela voltaria ao local porque está completando 4 anos que o pai ela, Antonio Oliver Filho, faleceu.
Quando Kathy estava registrando o bolbetim de ocorrência sobre o furto das peças antigas e do portão, cujo valor material é dificil estimar porque se trata de objetivos feitos há décadas, ela encontrou outro vítima, Eduardo Pieruccetti. "Comentaram que já foram feitos mais de 30 BOs e acho que precisamos iniciar um movimento para que os furtos parem e, também, para que sejamos indenizados", prega ela.
Além do valor material - no caso do túmulo da família Oliver, algo que pode superar entre os R$ 10 mil a R$ 12 mil -, Kathy lembra do valor histórico e emocional para as famílias. "O meu pai tinha feito uma lápide, para a tia dele, Agostinha Oliver, que era algo pessoal, familiar, e não tera reparado", afirma.
Para ela, a situação mostra um abandono do poder público municipal com a memória da cidade. "Sinto que está tudo largado, que as reclamações começaram em dezembro e ninguém fez nada. A Prefeitura afirma, nas reportagens, que a Guarda Municipal passa por ali, isso não pode ser porque muitos túmulos foram furtados".
Resposta
Em resposta a reportagem sobre o problema, publicada por O Diário, na última terça-feira (14), a Prefeitura orientou que as pessoas lesadas registrem o boletim de ocorrência. Veja a resposta a seguir:
“A Secretaria Municipal de Segurança informa que a segurança no Cemitério São Salvador é feita pela Guarda Municipal, por meio de rondas. Este trabalho vem sendo intensificado para ampliar a segurança no local. Além disso, o cemitério também conta com cercas do modelo concertinas nos muros, para prevenir invasões. Às famílias, a pasta orienta que sejam elaborados boletins de ocorrência sobre os casos e que a administração do cemitério seja informada sobre a ocorrência de furtos”.
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