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EDITORIAL

O poder da pressão

'A fila mogiana por um transplante ganhou rosto e identidade quando um paciente veio a público e falou sobre a luta pela saúde vivida por 60 mil brasileiros'

O Diário
22/10/2023 às 13:00.
Atualizado em 22/10/2023 às 13:01

Médicos e pacientes têm defendido discussão sobre a lei brasileira que termina por deixar nas mãos dos familiares, e não do sujeito doador, a decisão final sobre a prática. Será o melhor? (Imagem: Reprodução)

Ao mesmo tempo em que se manifesta por meio do caos, déficit e desalento, o Sistema Único de Saúde (SUS) assegura o milagre da esperança e vida a milhares de brasileiros todos os dias. Essa ambiguidade faz este serviço público pular da referência de odiado e desprezado a amado, valorizado e reconhecido também todos os dias.

Com 35 anos e responsável pela saúde de 210 milhões de pessoas, o que o torna recordista mundial e exemplo para países desenvolvidos pela horizontalidade que proporciona no acesso à saúde, o SUS garantiu no pior momento de nossa história recente, na pandemia de Covid-19, a salvaguarda de milhares de vidas. Segue acertando e errando.

Começamos por esse cenário para falar sobre a fila do transplante de órgãos que escalou interesse e holofote depois do que viveu o apresentador Faustão.

 Na barafunda que se torna o acesso a um leito hospitalar ou UTI, um exame pouco mais sofisticado ou mera consulta com um especialista (que pode levar meses para ser realizada em muitas cidades, inclusive aquelas com um bom número de equipamentos públicos, como Mogi das Cruzes), demandas como a espera por um órgão perde lugar de interesse e o poder de pressão popular e política por mudança.

É a regra do jogo num mundo com tanta urgência e desigualdade.

Em Mogi das Cruzes, a fila local para um transplante de rim pode levar até 21 meses e para um coração, 7 meses, segundo apurou O Diário, junto ao Ministério da Saúde. Essa espera ganhou rosto e identidade com o relato de um paciente sobre como é viver sem saber quanto essa máquina complexa, corpo e mente, aguenta sem um novo coração ou rim. 

Serve de exemplo a mobilização iniciada pelo mogiano Wellington Longo, autor de posts em suas redes sociais que atraíram engajamento de outras pessoas (clique e confira reportagem). Mais e mais é preciso falar e cobrar soluções para fazer essa fila andar. Médicos e pacientes têm defendido discussão sobre a lei brasileira que termina por deixar nas mãos dos familiares, e não do sujeito doador, a decisão final sobre a prática. Será o melhor? Uma ampla e nacional discussão responderá a isso. A lei atual foi válida até agora. Mas, pode ser uma boa hora para mudar.

O que sentiu esse mogiano, uma espera tão longa por um coração que levou à falência dos rins e a necessidade de não apenas um, mais de dois órgãos, está acontecendo agora mesmo com 60 mil brasileiros. E o país tem tecnologia e mão de obra especializada para esse procedimento.

Após a reportagem publicada por este jornal, no sábado, coincidentemente, a espera de Wellington terminou. Ele recebeu o rim. Foi priorizado.  

Acaso ou não, o fato de falar sobre seu drama foi instrumento para chamar a responsabilidade das autoridades e do sistema de saúde. E deu resultado. Agora já sabemos quantos meses duram esse suplício em Mogi. 

O apagamento da realidade na saúde e demais setores públicos interessa a quem, por negligência ou até desconhecimento, não toma decisões e passos exigidos para melhorar os índices de sobrevida de quem tem uma grave doença renal ou do coração. 

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