Corpo do treinador, que tinha academia há mais de quatro décadas na cidade, será velado a partir das 18 horas desta quarta-feira (1º), no Velório Cristo Redentor
Haroldo Simões morreu nesta quarta-feira (1), aos 78 anos, em Mogi das Cruzes (Reprodução - Redes Sociais)
Mogi das Cruzes perdeu na madrugada desta quarta-feira (1º) um dos pioneiros do fisiculturismo e da musculação na cidade. Aos 78 anos, Haroldo Simões, professor aposentado da rede estadual de ensino e treinador de musculação morreu, após sofrer uma parada cardíaca. Durante mais de quatro décadas, ele comandou academia no município, onde ainda treinava todos os dias. O corpo será velado no Velório Municipal Cristo Redentor, no Parque Monte Libano, a partir das 18 horas, e o sepultamento ocorrerá nesta quinta-feira (2), no Cemitério São Salvador, no mesmo bairro, mas o horário ainda não foi definido pelos familiares.
Haroldo se dedicava aos exercícios físicos desde 1964. Em 1978, montou a academia denominada Harold’s Gym, que funciona até hoje na rua Hamilton Silva e Costa, no centro. Nascido no prédio onde funcionou o Hotel Simões, de propriedade de seu pai, Ayres Simões, e que ficava na rua Dr. Ricardo Vilela, nas proximidades da praça Sacadura Cabral, Haroldo passou a infância nesta região.
Foi ainda nesta época que começou seu envolvimento com o esporte, de início jogando em campinhos da Cidade e, aos 13 anos, já como integrante das equipes do União Futebol Clube, pelo qual foi campeão várias vezes. Também teve passagem por outros times da cidade, como Vila Santista, Comercial, Mineração, Tietê e XI da Saudade, além de ser cotado para fazer parte de equipes profissionais como o Santos, onde teve oportunidade de realizar teste jogando ao lado de Pelé (Edson Arantes do Nascimento).
Formado em Educação Física em Santos, ele lecionou em 17 escolas da rede estadual, em Mogi, até se aposentar, quando dava aulas na Vila Cléo e Jardim Universo.
Personagem da série Entrevista de Domingo, de O Diário, em 24 de outubro de 2010, Haroldo relembrou o auge de sua academia, que nas décadas de 80 e 90 atraía pessoas de várias cidades da região, e contou suas histórias vividas em Mogi. Confirma a íntegra da publicação:
Como foi a sua infância?
Quando nasci, meus pais Ayres Simões, que era português, e Isabel Muniz Simões, que era espanhola, moravam na Rua Dr. Ricardo Vilela, em frente à Praça Sacadura Cabral, onde hoje funciona a farmácia Drogadouro. Ali, era o Hotel Simões, que pertencia ao meu pai e que, geralmente, hospedava os artistas dos circos que vinham para Mogi e se instalavam no Shangai. Como fazíamos amizade com eles, eu e meus irmãos (Ary, Wilson - ambos já falecidos -, José Benedito e Ayres Filho) sempre ganhávamos ingressos para assistir aos espetáculos. Passei a infância ali naquela região e jogando bola no campinho de mato que ficava atrás do União. Ficávamos com o pé preto e depois íamos nadar no Rio Tietê, onde também bebíamos água, de tão limpo que era. Depois, meu pai vendeu o hotel e montou o Bar Guarani, em frente ao Mercado Municipal. Na Cidade, havia os hotéis Jardim, Marabá, Estância dos Reis, Avenida e Sete Lagos. Este último ficava no Rodeio, onde hoje é a Criex, e recebia muitos artistas famosos.
Ficaram mais recordações desta época?
Perto do Hotel Simões havia um sobrado, onde na parte de baixo ficava o salão de barbeiro do pai do Mauricio de Sousa (Antônio Mauricio de Sousa). Ele dava bala para as crianças e me chamava de Portuguesinho, por causa do meu pai. Em cima, era o comitê da Ivete Vargas, que era sobrinha do Getúlio Vargas. Outra lembrança da infância é que, em 1953, o Palmeiras foi campeão e conquistou o primeiro título mundial. Naquele tempo, havia o trem de aço, que saía de São Paulo e ia para o Rio de Janeiro. Alguns jogadores do time, como Turcão, Jair da Rosa Pinto, Oberdan e Juvenal, viajaram nele e paravam em todas as estações para comemorar a vitória com os palmeirenses de cada cidade. Eles fizeram o mesmo em Mogi e foi uma grande festa. Também me recordo que gostava de brincar na Maria Fumaça enquanto ela ficava parada na estação e, quando saía, nós corríamos e pulávamos da plataforma. Além disso, como sempre morei no Mogilar, vi muita enchente e foi assim que aprendi a nadar. Tem mais: nós pegávamos banana do brejo para vender na porta do campo e comprar o ingresso para os jogos do União.
Onde o senhor estudou?
Estudei o primário no Grupo Escolar Coronel Almeida, onde tive professoras como Maria Aparecida Barreto, dona Florisbela, Carolina e Ruth. No quarto ano, fiz o curso preparatório para o Exame de Admissão com a dona Ester e Etelvina, que davam aulas na Rua Dr. Paulo Frontin. Fui aprovado para o Ginásio do Estado (hoje Escola Estadual Dr. Washington Luís), mas meu pai achou melhor que eu estudasse no Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial), onde me formei no curso de ajustagem. Em 1963, fiz novamente o Exame de Admissão e, desta vez, entrei no ginásio do Liceu Braz Cubas, onde tive aulas com os professores Wilson Cury, Cid e Therezinha Boucault e Maria José Grinberg. Não participava da fanfarra, mas disputava todos os campeonatos esportivos, como a Brascol, uma competição entre os alunos do Liceu e do Ginásio do Estado. Na última delas, houve sete modalidades e ganhei duas medalhas, uma de futebol de campo e outra de salão. Também jogava nas Olimpíadas Estudantis, que reunia todas as escolas de Mogi e lembro que o Liceu ganhava quase todas as vezes.
E a juventude?
Ia aos cinemas Odeon, Parque, Avenida, Vera Cruz e Urupema de segunda a domingo. Costumávamos assistir aos programas de calouros apresentados pelo Antonio Alexandre na Rádio Marabá, que ficava em cima do Odeon, e depois íamos para a sessão Pif Paf, que exibia seriados como ´Flash Gordon´, ´Zorro, ´Império Submarino´, entre outros, e depois os filmes em cartaz. Não gostava de bailes, mas no Carnaval, saía no Ki-Frio, que era o bloco do Tietê. Também costumávamos pegar frutas na chácara do Carlos Alberto Lopes, que foi prefeito, e saía atrás de nós dando tiros. Outra curiosidade é que, quando estudava no Coronel Almeida, fiquei de castigo e, durante seis meses, tive que ajudar o Padre Roque como coroinha. Um dia, ele falou para minha mãe que eu levava jeito para padre, mas não aceitei. Meu sonho era ser jogador de futebol.
Qual foi seu primeiro emprego?
Foi aos 15 anos, na área de montagem da Elgin do São João. Depois, fui para o setor de mecânica da Mineração (Geral do Brasil), onde trabalhei quatro anos. Após o ginásio, fiz o Madureza, que conclui em 1969 e, como gostava de esporte, o Malinha (Francisco Cupello Filho), me chamou para estudar Educação Física em Santos. Na época, só havia este curso lá e na USP (Universidade de São Paulo). Então, fomos em um grupo de mogianos formado por José Figueiredo Carias, José Rodrigues de Moraes, conhecido como Juca Paco, Jair Salvarani, João Batista Martins e o Massashiro, que tinha uma perua, nos levava e trazia todos os dias e nós o pagávamos por mês. Os testes para ingresso eram rigorosos e exigiam que fôssemos atletas, porque havia uma semana de provas de atletismo, natação, entre outras. Quando comecei a estudar lá, estava trabalhando no Banco Moreira Sales, na Avenida (Voluntário Fernando Pinheiro Franco), mas acabei saindo de lá e comecei a lecionar na Vila Ipelândia, em Suzano.
Devia ser cansativo...
Era muito. Então, no segundo ano do curso, passamos a ficar numa pensão em Santos, apenas durante a semana, onde também ficavam as atletas do basquete feminino, que estudavam lá. Era comum encontrarmos o Pelé (Edson Arantes do Nascimento) nos intervalos das aulas, mas tínhamos dificuldade para conversar com ele, que vivia rodeado de repórteres. Numa oportunidade, contei a ele o episódio do teste no Santos e lembro que ele me disse que, no futebol, é necessário ser bom de bola e ter sorte. No meu caso, havia faltado sorte. Ele era sossegado, atencioso e educado. No primeiro ano em que estudei lá, houve a Copa de 70, o Pelé não fez o primeiro semestre inteiro e os inspetores da USP falaram que se ele fosse aprovado, a faculdade seria fechada. Então, me formei em 1972 e ele um ano depois.
Ao final do curso o senhor voltou para Mogi?
Mesmo enquanto estudava, sempre vinha para cá aos finais de semana e, após formado voltei a morar com meus pais, já na Rua Hamilton Silva e Costa, onde ele construiu a casa em que moro até hoje. Lá, montei a academia de musculação em 1978, mas treino desde 1964 e comecei depois que fiz um curso com o americano Joseph Welder, no Rio de Janeiro. Na época, eu era magro, pesava só 56 quilos, e ele oferecia US$ 10 mil para quem não conseguisse se desenvolver com o método dele. Aceitei o desafio e logo estava com 63 quilos. Mas na época, quem contasse que fazia halterofilismo era chamado de gay, então, não disse nada a ninguém e treinava em casa. Em 1978, um grupo de rapazes me incentivou a montar a academia e, em pouco tempo, já estava com 300 alunos, entre homens e mulheres, de Mogi e vindos de outras cidades da Região. Fui o primeiro professor de musculação com diploma de Educação Física da Cidade e, no início, como tinha feito ajustagem no Senai, ia ao ferro-velho e comprava o material para montar os equipamentos. Depois, com o tempo, os vendi e adquiri os profissionais. Além disso, de 1980 a 1985, tive academia dentro do Clube de Campo. Tive alunos como Betão Miller, o prefeito Marco Bertaiolli, o juiz de Direito Edvaldo, o médico Sidnei Mori, entre muitos outros.
Aos 66 anos, o senhor ainda treina?
Treino duas horas por dia, de segunda a sábado, até hoje, não tive nenhum problema de saúde e não tomo remédios. Sou contra os anabolizantes e, para mim, quem os toma é dependente químico e não atleta. Se as pessoas que usam este tipo de droga lessem a bula, não continuariam porque causa câncer de próstata e de fígado, diabetes, impotência sexual, queda de cabelo, velhice precoce e até os rins podem parar de funcionar. Consigo manter a forma física só com treino, alimentação correta e levedura de cerveja, vitaminas, sais minerais e óleo de fígado de bacalhau. Há mais de 30 anos uso a mesma numeração de roupa e fico entre 80 e 85 quilos. Quando termino o treino, parece que tomei uma transfusão de sangue do Superman.
O senhor também lecionou Educação Física?
Dei aulas de 1970 a 1996 e passei por 17 escolas estaduais de Mogi. A primeira foi o Terceiro Colégio do Estado, que depois passou a se chamar Escola Estadual Firmino Ladeira. De lá, fui para o Washington Luís, Coronel Almeida, Rodolpho Mehlmann, Aprígio de Oliveira, Francisco Ferreira Lopes, Leonor de Oliveira Melo, Iracema Brasil de Siqueira, além de escolas do Rodeio, Braz Cubas, Vila Cléo e Jardim Universo, até me aposentar. Aqui em Mogi, depois de formado, ainda fiz os cursos de técnico de natação e de futebol, com o Fernando Soraggi, mas nunca exerci estas atividades, apesar de ter vontade de abrir uma escolinha.
E seu envolvimento com o futebol?
Começou aos 13 anos, no União (Futebol Clube), onde fiquei apenas um ano e fui para o 1 de Setembro, que não tinha campo e mandava jogo no campo do União, na Rua Casarejos. Em 1963, estava saindo do Tiro de Guerra, aqui em Mogi, e um olheiro do Santos, chamado Níveo Ribeiro da Silva, me levou para fazer testes lá. Era o tempo em que jogavam Dorval, Mengálvio, Coutinho, Pelé e Pepe, que formavam o melhor ataque santista. Fiz três treinos com eles e em cada um, marquei um gol. No último deles, o técnico disse que enquanto não saísse um gol, o treino não terminaria e eu marquei. Então, todos me carregaram no colo para comemorar. Não sei o que aconteceu, mas não fui chamado para jogar no time, fiquei decepcionado e não quis mais tentar carreira como jogador profissional.
Mas o senhor continuou jogando...
Fiquei conhecido no futebol como batedor de faltas e ´Haroldo Coração de Leão´ porque, quando estávamos perdendo, partia para cima, com garra mesmo, para tentar virar o jogo. Fui campeão várias vezes no União e ganhamos o título do quarto centenário de Mogi, em 1960. Depois, joguei pela Mineração e participei de um amistoso contra o juvenil do Corinthians. Também passei pelo Tietê e o último foi o XI da Saudade, onde jogava no segundo quadro de veteranos. No primeiro quadro entravam os profissionais vindos de São Paulo, como Roberto Dias, do São Paulo, Luizinho, conhecido como Pequeno Polegar, do Corinthians, Lima e Tremembé, do Palmeiras, Mão de Onça, que era goleiro, Ademar Pantera e Garrincha, entre outros.
Há mais lembranças desta época?
Houve um jogo do segundo quadro contra o Parque da Moóca, que estava há 40 partidas invicto, que ficou na história. Nós ganhamos de 2 a 1 ,mas foi uma briga tremenda em campo. O Heros Brasil, que tinha o apelido de Boião, bateu a cabeça no alambrado e abriu o supercílio. Outro jogador entrou no lugar dele, que foi levado ao hospital para fazer curativo. Só que, saindo de lá, ele voltou ao campo do União e queria entrar no jogo novamente. Eu não era de brigar, só apartava, mas sempre havia confusão. Fiquei no futebol até que o campo do União foi desativado.
Houve envolvimento com a política da cidade?
Como sempre conheci muita gente, fui candidato duas vezes a vereador a pedido do Padre Melo (Manoel Bezerra de Melo, ex-prefeito) e Waldemar (Costa Filho, ex-prefeito), mas não tinha coragem nem de pedir votos porque para ser político é preciso ter duas caras e eu não tenho.
O senhor só se casou aos 56 anos. Por quê?
Tive namoradas, mas houve muitas decepções, então, não me casei até que conheci a Isabel, aqui na academia. Ela veio treinar e acabamos ficando juntos. Hoje, estamos casados há 10 anos.
Quais as suas distrações?
Viajei para Curaçao durante 11 anos, conheci Aruba, Paraguai, Buenos Aires, Venezuela e Caribe, mas depois que minha mãe faleceu, há dois anos, a situação mudou. Hoje, gosto de assistir a filmes antigos e de musicais, além de ouvir meus CDs, principalmente de ópera. Sou sãopaulino, mas o futebol está violento e os jogadores viraram gladiadores. Antigamente, ia a estádios, como o Maracanã, onde vi a Seleção Brasileira jogando, e o Pacaembu, só que hoje não dá mais.
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