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Aluno de 13 anos que matou família na Paraíba pode não ser psicopata

O adolescente de 13 anos que matou a própria mãe e o irmão de 7, no município de Patos, no sertão da Paraíba, pode não ser um psicopata. Numa análise preliminar, o psiquiatra forense Talvane de Moraes, um dos fundadores da Associação Brasileira de Psiquiatria que por anos atuou em grandes investigações criminais do país, […]

21 de março de 2022

Reportagem de: O Diário

O adolescente de 13 anos que matou a própria mãe e o irmão de 7, no município de Patos, no sertão da Paraíba, pode não ser um psicopata. Numa análise preliminar, o psiquiatra forense Talvane de Moraes, um dos fundadores da Associação Brasileira de Psiquiatria que por anos atuou em grandes investigações criminais do país, disse que um detalhe sobre a dinâmica do crime indica que o jovem tinha plena consciência dos atos graves atribuídos a ele.

Segundo a polícia, a primeira versão dada pelo estudante, quando os investigadores chegaram até sua casa, foi que teria ocorrido um assalto. Só depois, ele admitiu ter matado a família porque foi proibido de usar jogos online após uma série de notas baixas na escola. Policial militar, o pai, também baleado no tórax, sobreviveu. Para Talvane, que atuou como pesquisador do Instituto de Psiquiatria da UFRJ, onde se formou, esse detalhe pode mudar o entendimento das autoridades sobre o perfil do menor acusado.

– Os estudos internacionais mostram que há duas condições básicas para se classificar um psicopata, em casos de crimes bárbaros como esse. Uma delas é a motivação, ela precisa ser frágil, fútil ou vazia. Nesse caso, o adolescente tinha uma motivação bastante frágil, mas, dentro da imaturidade adolescente, ele acreditava que podia fazer o que fez pelo fato de ter sido proibido de fazer seus joguinhos. A segunda condição é que o psicopata costuma cumprir um ritual, ele se prepara para o momento do crime, normalmente sem uma razão definida, como foi, por exemplo, no caso do estudante de Realengo que voltou à escola onde estudou e matou seus colegas. Ele, que se matou depois, deixou uma carta fantasiosa em que dizia acreditar ter “libertado” os adolescentes que matara. Não havia um motivo, mas teve todo um ritual, uma preparação – explica o médico, referindo-se ao episódio que ficou conhecido como Massacre de Realengo, em abril de 2011, em que Wellngton Menezes de Oliveira matou 13 alunos da Escola Municipal Tasso da Silveira.

Talvane observa que a sociedade precisa estar preparada para esse debate de que adolescentes, sem doenças mentais, podem cometer crimes bárbaros:
– Uma minoria desses crimes é cometida por um psicopata ou uma pessoa com doença psiquiátrica. Nós temos que enfrentar essa realidade. Eu costumo dizer que só temos um caminho, que é a educação. Fora disso, caminhamos para a barbárie. Esse caso da Paraíba tem que ser muito bem analisado, mas é preciso ver todo o histórico, todo o contexto para entender como o crime aconteceu. O nordeste tem um passado de violência, em que culturalmente se justifica atos extremos. Há rivalidades entre famílias, que atravessam os anos. Tudo isso importa, impacta. Não é por acaso que as principais democracias ocidentais têm penas diferenciadas para adolescentes porque é uma fase da vida em que eles ainda não têm maturidade completa para ter toda a dimensão das consequências de seus atos e escolhas. Isso não diminuiu a responsabilidade deles. No caso desse jovem da Paraíba, ele terá que cumprir medida socioeducativa. Mas há uma reflexão importante que precisamos fazer sobre banalização da violência e sobre a falta de investimento em formação, em educação.
O psiquiatra lembra ainda outro caso, de 2003, em que o casal Felipe Silva Caffé, de 19 anos, e Liana Bei Friedenbach, de 18, foram torturados e assassinados por quatro homens e um adolescente, Champinha, apontado como líder do grupo. Ele, atualmente, está num manicômio por ser considerado de alto grau de periculosidade social.
– O Champinha é um desses casos. Ele sentiu um forte desejo sexual e achou que isso justificava o que fez. Para ele, era plenamente justificável, mas isso não quer dizer que ele seja um psicopata. Quando perguntado por que ele atacou o casal, ele respondou que fez porque achou a moça bonita – observa o psiquiatra.- O adolescente é fruto dos estímulos que recebe ao longo da vida. Ele age dentro da maturidade que tem e que muitas vezes reproduz a Lei do Talião (a ideia de “olho por olho, dente por dente”, que apareceu no código Babilônico de Hamurabi de 1770 A.C).

Pai ferido

O homem que foi baleado pelo próprio filho, de 13 anos, dentro de casa na Paraíba, está internado na ala vermelha do Hospital de Trauma de Campina Grande, de forma que seu estado de saúde é grave, mas estável, de acordo com o médico Caio Guimarães. O cirurgião contou ao Globo que conversou com o policial militar reformado na manhã desta segunda-feira (21) e disse que ele já não sente mais muitas dores. O profissional disse que o paciente ainda não passou por nenhum procedimento cirúrgico, pois continua em observação neurológica pela equipe da unidade, ou seja, há fragmento do projétil alojado em sua coluna. Por conta do ferimento, apresenta dificuldade em mover a parte inferior do corpo.

— Ele está com déficit motor e sensitivo nos membros inferiores, está sendo avaliado dia a dia para ver questão de sequelas — disse Guimarães, acrescentando que o paciente precisa de observação por conta da lesão, para que a equipe possa decidir se mantém a conduta conservadora ou se faz a intervenção cirúrgica. — A equipe de neurocirurgia do hospital no momento optou por conduta expectante. (A cirurgia) depende da evolução do paciente e da equipe de neurocirurgia que está acompanhando o caso de perto.

O PM foi atingido no tórax, na tarde do último sábado, quando chegou à casa onde morava com a família e se deparou com a mulher morta com um tiro na cabeça, disparado pelo filho mais velho do casal. O garoto de 13 anos disse à polícia que foi a “gota d’água” se sentir pressionado para estudar e fazer tarefas domésticas, sendo também constantemente impedido pelos pais de jogar online. Naquele dia, o pai havia pego o celular do filho como forma de castigo por notas baixas na escola.

— A motivação que o menor alegou após a confissão do ato infracional na delegacia, na presença da advogada e de uma parente, foi porque ele era pressionado pelos pais a tirar boas notas na escola e era proibido de jogar um jogo conhecido por “Roblox” e também era proibido de acessar o celular — relatou o delegado Renato Leite num vídeo enviado ao Globo neste domingo. — O pai havia saído para comprar um remédio pra mãe, que estava com dor de dente e aguardava deitada na cama, quando começou a chacina.

Ao ver que o pai tinha voltado para casa, o adolescente atirou também contra ele. O PM foi atingido na área do tórax. Assustado com a situação, o filho mais novo, de 7 anos, foi até o pai e o abraçou, momento em que seu irmão fez o último disparo, atingindo a criança nas costas.

Diante do evento traumático, o sobrevivente também recebe atendimento psicológico no hospital, sendo acompanhado pela equipe multidisciplinar.
Quando o serviço de emergência chegou à casa onde houve as mortes na tarde de sábado, o autor dos disparos alegou que havia acontecido um assalto, mas os policiais verificaram que tinha sido ele quem atirou contra a própria família.

— Eu percebi que ele, quando soube que o pai ainda estava vivo, se assustou. Acho que ele estaria mais satisfeito se todos os três tivessem falecido — disse o delegado à “TV Sol”.

Na tarde de domingo, o jovem teve sua internação provisória decretada pela Justiça e foi encaminhado para o Centro Educacional do Adolescente da Paraíba, no município de Sousa.

Abalados pela tragédia familiar ocorrida numa residência do município de Patos, no sertão paraibano, moradores do bairro Jardim Guanabara realizaram um ato ecumênico neste domingo, às 15h. Por volta deste mesmo horário, no sábado, o adolescente de 13 anos matou sua mãe e seu irmão mais novo, de 7 anos, e atirou contra o pai.

— A virtualização da vida tem banalizado os laços afetivos e afastado as pessoas do contato e convívio social, provocando destruição de famílias — disse o delegado Renato Leite, responsável pela investigação, já concluída.

A mãe foi baleada na cabeça enquanto estava deitada no quarto do casal. O barulho do tiro assustou o irmão mais novo, que estava em seu próprio quarto. O delegado disse que a criança começou a brigar com o adolescente quando percebeu o que tinha acontecido. O autor então chegou a correr atrás do menino para atirar nele também.

Depois da chacina, foi o próprio adolescente quem acionou o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu) e a polícia. Leite contou que o autor do ato infracional guardou a arma de fogo do pai no mesmo lugar onde ela estava guardada, dentro de um armário de ferro no escritório.

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